No final de Hebreus 11, que traz a famosa galeria dos grandes heróis da fé, encontramos um resumo que ilustra de maneira sublime a dupla identidade da fé verdadeira. Ali, é possível se ver claramente que os grandes heróis da fé podem ser enquadrados em dois grupos muito distintos:
O primeiro é o daqueles que "por meio da fé, subjugaram reinos, praticaram a justiça, obtiveram promessas, fecharam boca de leões, extinguiram a violência do fogo, escaparam ao fio da espada… puseram em fuga exércitos de estrangeiros…". Estes viveram uma vida de fé, de conquista, de milagres, de orações respondidas.
No entanto, o texto também fala de outro grupo, que igualmente viveu uma vida de fé, mas que "foram torturados… passaram pela prova de escárnios e açoites, sim, até de algemas e prisões. Foram apedrejados, provados, serrados pelo meio, mortos ao fio da espada; andaram peregrinos, vestidos de peles de ovelhas e de cabras, necessitados, afligidos, maltratados… errantes pelo deserto, pelos montes, pelas covas, pelos antros da terra". Para estes, a fé não foi um instrumento de conquista, mas de resistência em meio à dor.
Tanto uns, quanto os outros, viveram uma vida de fé. A diferença é que enquanto uns experimentaram a fé "pró-ativa", a fé da conquista, do milagre, da cura, da restauração, os outros experimentaram a fé "reativa", a fé da resistência, da luta, do sofrimento.
A grande verdade apresentada nesta passagem é que a fé não é apenas um instrumento de alcançar as bênçãos de Deus, mas também, e principalmente, o meio de entrar em comunhão com Deus e experimentar o seu amor, ainda que tudo esteja conspirando contra. A fé verdadeira limpa o nosso coração das prioridades que nunca deveriam ter sido prioridades e nos purifica de qualquer tentativa de desenvolver uma relação utilitária com Deus.
Hoje, infelizmente, a religião tem reduzido a fé apenas à dimensão pró-ativa. Dizem que se você não vê o milagre, a cura, a resposta, a prosperidade, então é porque você não tem fé! Que mentira! Se a fé pró-ativa é importante e nos conduz para as vitórias, a fé reativa, igualmente importante, nos prepara para as perdas e fracassos da vida. A fé verdadeira não é um remédio anestesiante que evita a dor, mas o "fortificante" que precisamos para suportar a dor. A mesma fé que é necessária para sair do leito de enfermidade é necessária também para ali permanecer sem entrar em contradição consigo mesmo e com Deus. Como disse o sábio Salomão, "se te mostras fraco no dia da angústia, a tua força é pequena" (Pv 24.10).
Conta-se que na época da Segunda Guerra Mundial, quando as tropas nazistas invadiram a cidade de Varsóvia, uma jovem judia escondeu-se no porão de sua casa. Terminada a guerra, uma família ocupou a casa e, descendo ao porão, encontrou a ossada da jovem e, ao lado, três frases escritas na parede: "Eu acredito no sol, mesmo que esteja nublado; eu acredito no amor, mesmo que não esteja sentindo; eu acredito em Deus, mesmo que Ele fique em silêncio!". Este é mais um belíssimo exemplo da fé reativa, que confia em Deus e mantém o coração voltado para Deus em todos os momentos, na alegria e na tristeza, na fartura e na escassez, na saúde ou na doença.
A grande questão, portanto, não é se o milagre vai ou não acontecer, mas se o coração está voltado para Deus ou para nós mesmos. A fé é um instrumento de conquista, mas também é um instrumento de resistência. Não esqueça disso, e que Deus lhe abençoe.
Clinton César
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